Uma Vida Dedicada à Cultura
A recente morte de Haroldo Costa, ocorrida no último sábado (13) no Rio de Janeiro, marca o fim de uma trajetória rica que abrangeu o teatro, o jornalismo, a televisão, a música e a essência do Carnaval. Natural do bairro de Piedade, na Zona Norte carioca, Costa foi uma figura essencial na valorização do samba, das escolas de samba e das expressões culturais afro-brasileiras no Brasil.
Por várias décadas, Haroldo atuou como analista do Carnaval, integrando, nos últimos anos, o corpo de jurados do Estandarte de Ouro, premiação do jornal O Globo. Antes disso, ele fez parte da comissão julgadora da Liga Independente das Escolas de Samba (Liesa), onde contribuiu significativamente para o debate sobre critérios, memória e o reconhecimento do samba como uma importante expressão cultural.
Início no Teatro Experimental do Negro
A carreira de Haroldo começou no Teatro Experimental do Negro (TEN), um grupo fundado pelo militante antirracista Abdias do Nascimento. Este espaço foi fundamental para reunir artistas e intelectuais negros, promovendo a afirmação cultural e o combate ao racismo nas artes cênicas. Dentro desse ambiente enriquecedor, Haroldo desenvolveu suas habilidades como ator e pesquisador.
Em 1956, ele fez história ao estrelar a peça “Orfeu da Conceição”, escrita por Vinicius de Moraes, com trilha sonora de Antonio Carlos Jobim. O espetáculo não apenas solidificou a parceria entre o poeta e o compositor, mas também levou Haroldo ao palco do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, tornando-o o primeiro ator negro a protagonizar uma montagem nesse prestigiado espaço. A produção foi marcada por cenários projetados por Oscar Niemeyer e um cartaz criado por Carlos Scliar.
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Brasiliana e Difusão Cultural
Após seu impacto no teatro, Haroldo Costa se uniu a um grupo que formou a companhia Brasiliana, composta por atores e dançarinos dedicados a promover a cultura popular brasileira. Durante cinco anos, o grupo embarcou em uma turnê internacional, apresentando danças, músicas e outros elementos da cultura brasileira em 25 países da Europa e das Américas. Essa experiência culminou na mostra “Haroldo Costa – Samba & Outras Coisas”, realizada pelo Sesi em 2011.
Com a passagem de Haroldo, a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro emitiu uma nota destacando sua contribuição como comunicador e produtor cultural, relembrando a exposição em homenagem à sua trajetória.
Contribuições no Cinema e na Televisão
Além de seu trabalho no teatro, Haroldo Costa também se destacou no cinema e na televisão, contracenando com grandes nomes como Ruth de Souza, Grande Otelo e Milton Gonçalves. Em 1999, participou da minissérie “Chiquinha Gonzaga”, de Lauro César Muniz, onde interpretou Raymundo da Conceição.
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De acordo com o projeto Memória Globo, um dos seus últimos trabalhos na televisão foi em 2012, na minissérie “Subúrbia”, de Paulo Lins e Luiz Fernando Carvalho, onde deu vida ao personagem Seu Aloysio.
No cinema, Haroldo fez história ao dirigir, em 1958, o longa-metragem “Pista de Grama” (ou “Um desconhecido bate à sua porta”), considerado por muitos como o primeiro filme de longa duração dirigido por um negro no Brasil, conforme destacado pelo escritor Nei Lopes.
A Produção Literária e a Preservação Cultural
Como historiador e pesquisador, Haroldo Costa foi autor de 15 livros, muitos dos quais abordavam questões relacionadas à identidade negra, cultura popular e samba. Entre suas obras mais notáveis estão “Fala, crioulo – O que é ser negro no Brasil”, além dos livros dedicados à escola de samba Salgueiro, como “Salgueiro: Academia do Samba” (1984) e “Salgueiro: 50 anos de Glória” (2003), que se tornaram referências em estudos sobre escolas de samba.
Em 2023, ele atuou como curador da exposição “Heitor dos Prazeres é meu nome”, realizada no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), reforçando sua importância na preservação da memória cultural negra.
Reconhecimento e Homenagens
Como filho de um carnavalesco, Haroldo Costa teve uma relação intrínseca com o Carnaval carioca. Diversas agremiações, como Imperatriz Leopoldinense, Estação Primeira de Mangueira e Salgueiro, lamentaram sua morte. A Liesa também prestou tributo, recordando a dedicação de Haroldo ao samba e ao Carnaval.
O Ministério da Igualdade Racial (MIR) também se manifestou, celebrando a carreira e a contribuição antirracista de Haroldo Costa. A nota ressaltou que sua trajetória está profundamente entrelaçada com a luta pela valorização das expressões culturais afro-brasileiras.
A deputada federal Benedita da Silva (PT-RJ) elogiou Haroldo em suas redes sociais, descrevendo-o como “referência absoluta do samba, do carnaval e da intelectualidade negra”. O escritor Nei Lopes o reconheceu como um dos seus maiores ícones e mencionou que Haroldo foi o primeiro diretor negro a realizar um longa-metragem brasileiro.
O velório de Haroldo Costa será realizado nesta segunda-feira (15) no Cemitério São Francisco Xavier, no Caju, na Zona Portuária do Rio de Janeiro, com sepultamento programado para às 14h.

