A Fantasia e a Realidade se Encontram
“De repente, percebeu que estava flutuando. Olhou para baixo e viu o caos. Não sentiu culpa. Apenas uma inédita sensação de paz”, escreve Victor P. Viana no conto que dá nome à sua nova obra, “O homem que vomitava sapos”. O autor e jornalista, atualmente residente em Búzios, lançou este livro pela editora Sophia, que será apresentado na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), no espaço Casa Gueto. A publicação reúne uma série de textos que navegam entre a fantasia, lirismo e delírio.
Através de suas crônicas, contos e artigos, Viana parece capturar a essência de viver em um país onde o absurdo faz parte da rotina cotidiana. Muitos desses relatos foram inicialmente divulgados no periódico satírico O Perú Molhado, que circulou entre 1981 e 2015 na cidade de Búzios.
— Os textos não se limitam à ficção; há relatos reais, entrevistas e reportagens que produzi sob a solicitação de meus editores — explica Victor. — Tudo isso, porém, é apresentado em um estilo literário que desenvolvi ao longo do tempo. O cotidiano, quando observado com um olhar atento, pode revelar-se extraordinário.
A Prosa de Crítica e Humor
Nesta obra, o cotidiano muitas vezes aparece distorcido, exagerado ou invertido, mesclando crítica social e humor. Um exemplo disso se encontra no conto “O saco de bosta”: “Homens, quando falam e são tidos como bosta, diz-se que bostejam. Bem, o saco de bosta bostejava de fato, de quando em vez ou de vez em quando — mais uma vez, tanto faz”.
Os cenários que Viana retrata são essencialmente do interior do Rio de Janeiro, destacando localidades na Região dos Lagos, como Cabo Frio e a própria Búzios.
— Este é o meu sertão — define ele. — Embora tenha trabalhado em redações tradicionais, onde a influência da internet ainda era um fenômeno emergente, foi aqui que desenvolvi meu olhar crítico. O jornalismo é crucial na formação desses textos.
Um Conto que Transcende Fronteiras
O conto que dá título ao livro, sobre um homem que, após passar a vida engolindo sapos, começa a vomitá-los em público, encapsula a força simbólica da obra. Viana observa que a narrativa não busca obrigatoriamente representar um ‘tipo de Brasil’, mas aborda temas universais através de personagens, sejam eles reais ou fictícios, que se desenrolam em ambientes que lhe são familiares.
É Davi Gautto, filho de Victor, quem contribui com as ilustrações que capturam o universo fantástico e grotesco das histórias.
— Foi uma emoção pura — comenta o autor. — A ideia de ter o Davi como ilustrador partiu do Rodrigo Cabral, editor da Sophia Editora. Ele é um desenhista precoce e talentoso.
Davi, por sua vez, relata que o processo de ilustração não foi complicado:
— É parte da minha linha de desenho. O mais interessante foi poder ler os textos do meu pai antes de começar. Eles fluíram naturalmente.
O jovem artista, que possui apenas 16 anos, ressalta que a imagem do conto-título foi a mais impactante para ele:
— Sabia que essa seria a história central do livro, então busquei retratar as emoções que senti ao lê-la.
A Obra e Seu Reflexo no Cotidiano
A obra de Viana reflete o poder das narrativas híbridas, entrelaçando jornalismo e ficção, memória e delírio, pavor e poesia. E talvez a saída para todos nós, em meio a um mundo caótico, seja essa: vomitar os sapos e flutuar.
Sobre o Autor
Victor P. Viana nasceu em Itaboraí, cresceu em Cachoeiras de Macacu e, desde 2005, vive em Búzios. A sua visão sobre essa cidade litorânea, parte de uma região rica em histórias, é clara:
— A Região dos Lagos é meu sertão.
Ele é casado com a jornalista e escritora Camila Raupp e é pai de três meninos. Com uma carreira que abrange a escrita, pesquisa e jornalismo, seu livro mais recente, “A criança debaixo do guarda-chuva” (2021), explora a vida de uma criança em um estilo poético que desconstrói clichês e apresenta uma narrativa não sexista.